Eu caminhei por planícies verdes e atravessei montanhas cobertas de neve. Molhei meus pés na nascente de um rio, olhei para o céu e imaginei formas nas nuvens. Vi o mundo com os olhos de um recém-nascido. Tudo era tão novo. Tudo era tão maravilhoso.
Naquela noite eu dormira ao relento, com o frio gelando meus ossos e me fazendo tremer. Vislumbrei um flash de luz vermelha ao longe. Mesmo que distante, eu senti o calor em minha pele, mas meus ossos continuavam gélidos.
Logo o brilho foi se aproximando e as chamas se tornaram nítidas. Percebi um rastro de cinza que permanecia nos locais onde ela passou. Quando menos percebi, o mundo inteiro era feita de cinzas, com exceção do ponto em que eu me encontrava, já em pé, observando a doce destruição.
Aquelas chamas atraiam meus olhos e logo esqueci de tudo ao meu redor. As belas planícies verdes, montanhas cobertas de neve, nascentes de rios e formas no céu já não existiam mais. Tudo consumido pela devastação daquela incrível chama, que caminhava em minha direção.
Logo ela circundou meu corpo e ficou parada. Eu queria aquele calor. Estava fascinado por ele. Mesmo que meu corpo fosse destruído, valeria a pena, se eu sentisse a euforia daquele calor por um milésimo de segundo. Fechei meus olhos e aguardei.
Os segundos que passaram pareciam-se com milênios. Aguardei, mas as chamas não vieram. Elas circulavam meu corpo e deixavam apenas o campo florido aos meus pés. Todo o resto era cinza, produzido pelas chamas vermelhas que me fascinavam.
Eu queria aquele calor! Eu precisava daquele calor! Mesmo com todo o fogo, inexplicavelmente meu corpo encontrava-se gélido por dentro. Sentia apenas um leve calor produzido pelo fogo, que mal ultrapassava minha pele. Meus ossos tremiam e o frio era a única sensação existente.
“Queime-me! Aqueça-me, mesmo que depois apenas minhas cinzas sobrem. Me livre desse frio, mesmo que apenas a destruição me aguarde dentro do calor!” – Eu gritei. Mas as sombras permaneciam paradas, estáticas, olhando e sorrindo em desalento para os meus olhos.
Tentei correr em direção ao fogo, mas meus pés não se moviam. Apenas meu corpo tremia.
Permaneci parado em um campo florido dentro de um mundo feito de cinzas. Cinzas que que eram levadas ao ar por pequenas rajadas de vento. O mesmo vento que, vez ou outra, fazia o fogo se aproximar de mim, antes de retroceder novamente, causando um leve calor. Calor esse que jamais poderia me aquecer, mas mantinha aceso a esperança das chamas me alcançarem e me consumirem.
Sorri ao perceber minha mortalidade que me alcançaria em qualquer momento, pois esperar a eternidade pelas chamas que jamais viriam seria, sem dúvidas, o maior castigo imposto à um homem. Sabia que o frio um dia cessaria, enquanto eu observaria as chamas de longe, transformando o mundo em cinzas e gerando a destruição que eu nunca sentiria.
O que mais me entristeceu foi perceber que as chamas choravam de longe, ante a impossibilidade de se aproximarem de mim. Perceber que elas também desejavam me consumir, assim como eu desejava ser consumido por elas, mas estavam impossibilitadas de se aproximarem de mim.
E assim nosso encontro infrutífero continuaria, até o meu encontro final com a minha mortalidade ou o cessar do incêndio.
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